Já disponibilizei, aqui no blogue, bastante informação acerca da mais recente aposta da Porto Editora: A Cabana, de Wm. Paul Young. Por isso, passarei à crítica.
Começo por realçar que a sinopse da obra descreve o seu mote mas não deixa antever o cerne da narrativa, muito menos a profundidade e perspectiva com que o assunto é tratado. Mais do que uma ficção, esta obra é uma visão muito restrita, concreta e tendenciosa do conceito de Deus, da Igreja e da vivência humana.
A partir do prefácio, é possível tomar conhecimento do passado obscuro e do universo familiar de Matt, o protagonista. Este homem vive atormentado pelos seus fantasmas familiares, nomeadamente, pela Grande Tristeza, consequência do rapto da sua filha mais nova. Os primeiros capítulos debruçam-se, precisamente, sobre esta desventura.
Trata-se de um episódio emocionante e até perturbador, que retrata alguns dos mais profundos valores humanos, ao qual não pude passar indiferente. Associado a isso está o estilo, bastante cativante, o que me levou a não dar pelo passar das páginas.
Depois disso há uma viragem na narrativa, que se torna mais onírica, devido à focalização em Deus e na espiritualidade. E aqui devo fazer notar as minhas descrenças e agnosticismo, pois não consegui, de todo, deixar de considerar algumas observações sobre Deus palavreado para irracionais. Note-se: o escritor tem uma escrita consistente e a história narrada pode tocar os corações dos que têm uma grande fé. Porém, acho que a ambiguidade sobre as figuras divinas mantém-se, o que é frustrante.
À medida que a história evolui, surgem metáforas que remetem para a espiritualidade e a auto-ajuda. Nesse sentido, o protagonista coloca questões pertinentes e traz a discussão interessantes temas teológicos, mas como é usual neste tipo de literatura, o leitor nunca obtém uma resposta satisfatória - ou melhor, nunca obtém uma efectiva conclusão e por isso não me satisfiz. É que, na minha perspectiva – eventualmente ateia - ler a obra com espírito crítico resulta numa de duas consequências: ou nos tornamos verdadeiros ateus; ou lemos tudo como ficção e mitologia.
É que – e quase num desabafo ideológico – algumas passagens mostram contradições comuns e ridículas acerca de Deus, que por vezes é arrogante e incoerente. Acima de tudo, não tolero a ideia de que não precisemos de conhecer os desígnios da divindade, de que basta aceitá-los.
Ainda assim, a obra alerta para alguns paradigmas humanos interessantes, oportunos e relevantes, por isso faz-nos reflectir. E como a história demonstra, é importante parar para reflectir sobre o nosso modo de vida.
De uma forma geral, trata-se de um livro que de uma ou outra maneira nos influencia espiritualmente e nos leva a reflectir acerca da humanidade e das bases da nossa sociedade. É uma narrativa muito fluida, com surpresas e episódios muitíssimo bem delineados. Como já referi, cada página obriga-nos a ler a seguinte; e fi-lo com prazer.
Compreendo o sucesso da obra nos EUA e no Brasil, mas, sinceramente, creio que o enredo não se ajusta ou adequa tão harmoniosamente à mentalidade europeia. Apesar disso, tem tudo para ser um sucesso de temporada.
É uma obra para ler e sobre a qual reflectir. Nas bancas amanhã.
A Cabana de Wm. Paul Young
Fernando Dias Antunes, Porto Editora, 2009
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Boas leituras!