“O acordo ortográfico tem tanta excepção, omissão e casos especiais que não traz qualquer mudança efectiva”, disse o escritor angolano Mia Couto.
“Acho que [os governantes] estão a debater uma questão muito séria, muito séria - insistiu - sem informar suficientemente as pessoas sobre aquilo que estão a debater”, disse o escritor angolano Ondjaki.
“Eu sempre achei que o acordo ortográfico não é preciso: um brasileiro lê perfeitamente a ortografia portuguesa e um português lê perfeitamente a ortografia brasileira. Olha a ortografia, sabe que palavra é que é, pronuncia correctamente”, portanto “acho que é um desperdício de energias, um desperdício de dinheiro, e penso que se devia gastar o pensamento e as forças em outra coisa qualquer”, disse a catedrática brasileira Maria Lúcia Lepecki.
"Há muitos anos que eu venho ouvindo falar deste acordo, que sai e não sai. Mas, se eu olhar para o meu próprio país, que é Moçambique, nós somos tão diversos que de vez em quando acho que cada um tem o direito de escrever a sua língua portuguesa", disse a escritora Paulina Chiziane.
“Eu acho que se podia dispensar este acordo. Escrevo em português e penso que os portugueses vão continuar a escrever - sobretudo os da minha geração - no código em que foram ensinados. Na minha idade (84 anos), não vou agora mudar para uma ortografia - digamos - comum”, disse o ensaísta, professor universitário e filósofo Eduardo Lourenço.
Estes são apenas cinco de todos aqueles cidadãos, portugueses, brasileiros ou africanos, enfim, falantes do Português, que têm muitas reservas quanto a este Acordo Ortográfico que, ao que parece, já está juridicamente em vigor em todo o mundo lusófono, uma vez que três países já o ratificaram.
O novo Ministro da Cultura português anunciou, há poucos dias, que Portugal vai mesmo ratificar o Acordo e pô-lo em prática, declarando ainda que a anteriormente referida “moratória não deve ser usada no acordo ortográfico”, devendo este ser rapidamente introduzido pelos editores literários e escolares nacionais.
A Assembleia da República vai ouvir vários especialistas (é pena muitos deles terem, desde logo, um opinião tendenciosa) acerca do Acordo Ortográfico da Língua portuguesa mas a verdade é que pouco ou nada poderá mudar. O Acordo Ortográfico é hoje uma realidade, uma lei internacional. Resta saber como vão os governos passar da teoria à prática e pôr milhões de pessoas a escrever de uma outra maneira, que para além de diferente apresenta várias falhas, muitas especificidade e imensa estupidez.
Já se sentem mais próximos uns dos outros, amigos portugueses, brasileiros, africanos e asiáticos? A mim também me parece que não...
Para terminar, uma última nota sobre a 9ª edição do encontro de escritores de expressão ibérica, as Correntes d’Escrita, que terminou hoje com a entrega do Prémio Literário Casino da Póvoa a Ruy Duarte de Carvalho, no valor de 20.000 euros, pela obra Desmedida - luanda, são paulo, são francisco e volta. Crónicas do Brasil. Eis um género de iniciativa a ser imitado.